sexta-feira, 5 de junho de 2015

Inconsequente

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Antes de tudo, entenda... Eu sou o tipo de pessoa que dormiria embaixo de um pé de jaca sem pensar na jaca. C'est la vie. Não sou hipster, não é um modo de vida alternativo, uma filosofia de vida, um carpe diem incoerente ou algo do gênero. É só o jeitão da madeira. Num desses dias em que resolvi vestir blusa alaranjada com um blue jeans te vi na minha lanchonete de sempre. A vida é muito curta pra cozinhar todo dia apenas para um. Eu era freguesa regular, mas você não. Sabe a sensação de ter Joey Jordison usando seu peito como bateria? É. Eu não estava pronta pra fragrância de sálvia amadeirada, pra ver seu cabelo de sol, pros olhos de noite nublada, pra ver Apolo em homem, e ficar quieta. Os funcionários da lanchonete não estranharam quando fui sentar do seu lado (talvez você não tenha sido o primeiro deus que eu vi por lá). A conversa flui despreocupadamente, você está confortável e eu já sinto seu gosto na minha boca. Quero curtir o momento, a dança de olhares, as variações nas notas da conversa, o pisar em ovos, a expectativa do que está por vir. Você pede pra ir pra minha casa.
Existe coisa melhor do que encontrar outra pessoa que dormiria embaixo de um pé de jaca?
Tudo em você me deixava aérea... Seu toque, o calor que passava do seu corpo pro meu, a sala girando, seus olhos de noite... Noite que crescia e me engolia, exigindo tanto de mim que parecia que poderia me afogar a qualquer momento.
Não me lembro do momento que a noite de seus olhos viraram saco preto de lixo. A asfixia atrapalha meu raciocínio.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Bar cheio de amores vazios.

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O pensamento em você me leva pro bar. O auge dos clichês hollywoodianos pode ser resumido num bom pé na bunda. Só de pirraça mudo a bebida que costumo pedir, afinal, a última vez que a bebi foi com você. Até meus vícios você roubou. Meus olhos nublados, pra você não navegar minha alma no meio deles. Seria constrangedor você perceber o quanto eu te desejo depois de tudo o que aconteceu. Eu estava quieta, num oásis emocional: sentia um grande e imenso nada. Estava calma, não sentia estas palpitações, a insônia não era minha companheira (pensando bem, talvez estivesse no deserto e não entendesse). Não interessa o fato que antes de você eu estava vazia, esse vazio não me doía. Era um vazio de garrafa se preparando pra receber o vinho, de boca ansiando língua. Você me preencheu, me transbordou para depois me privar de tudo isso. Pra quê ser apresentado ao paraíso se só está aberto pra visitas? Simples: para a caminhada sobre a terra se transformar num inferno de solidão. A caminhada antes bastava, para frente bastava. Eu não ligava para os excessivos tons de cinza a minha volta. Não existia o êxtase, mas também não havia a depressão. Agora meu mundo tem cores cuja única função é me empalar com a saudade. O âmbar me lembra dos seus olhos, a turmalina os seus cabelos, a castanha tua pele. E sigo caminhando, amaldiçoando todo o mundo, que insiste em me afogar na tua lembrança. A cerveja ajuda a descer. Você foi um dos maiores golpes que o Fado deu no meu coração. O desgraçado perscrutou minha mente, viu o que eu entendia como “ideal” e me apresentou todas as minhas aspirações contidas num corpo, numa alma. Numa boca que eu podia jurar que fazia o tempo parar quando se encontrava a minha. Teu olhar me desnudava, e eu, consciente, gostava disso. E então, meu anjo perfeito se mostrou quebrado. E então, tudo mudou. E eu, então, resolvi que tudo bem. Ninguém chega inteiro, certo? Queria te buscar no meio da tempestade que se encontrava, e te dar um norte. Queria ser o seu norte. Rachaduras servem pra luz entrar, certo? Toda alma pode ser resgatada. Certo? O Fado queria me ensinar uma lição: eu não sei o que é melhor para mim. Tudo que eu idealizei se mostrou um monstro. Subestimei a natureza humana. Esqueci que as pessoas tem uma paixão recalcada pelo horrendo, pelo feio, por tudo que é condenado nas eternas regras castradoras que nos permitem viver em sociedade. Acho que essa paixão me guiou até este bar. E aqui estou eu, com uma multidão de pessoas, me balançando num ritmo “bate-estaca” na esperança de que em alguma dessas batidas, meu coração se reanime, que qualquer álcool me inebrie os sentidos, pra eu não sentir tuas formas, tuas cores, teu calor, teus beijos... Tuas saudades.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Sabores do amor

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Amos doce de noivos
ficou sem gosto com o casamento.
Finalmente azedo com a traição
e amargo com o cianureto.

domingo, 3 de julho de 2011

Amor morno

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Você tem seguido meus passos com o olhar. Não só meus passos. Meus movimentos, minhas palavras, meus olhares não muito discretos pra você. O sentimento está aqui, e você bem sabe.
Me provoca, se insinua e quando te provoco desconversa. Tuas palavras me envolvem e me tiram da realidade. Me levam pra algum lugar onde posso te pegar no colo e te chamar de meu, sem ninguém julgar, sem porém, talvez e entretanto. Você é simplesmente meu e eu sou seu.
Mas meu coração pede tarde de filme dando amasso, mãos dadas e beijo surpresa. Pede paixão, fogo, carinho e o teu corpo. Pede amor. E você?
- Deixa pra lá...
Deixo pra lá o que não é importante. Deixo pra lá o que não é urgente. Deixo pra lá o que tá cozinhando em banho-maria.
Amor se não for alimentado murcha, entorta o sorriso e deixa o samba desbotado. Amor não se deixa pra lá.

Amor não combina com banho-maria.

sábado, 23 de abril de 2011

Então...

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É do Ryotiras

sábado, 2 de abril de 2011

Inocente

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Ela não se destaca na multidão
Ela é de altura mediana.
Ela não usa maquiagem.
Ela tem o cabelo ondulado.

Mas não era culpa dela.

Ela não chama a atenção de ninguém.
Ela é tímida.
Ela não se declarou para o garoto dos seus sonhos.
Ela gosta de ficar em casa.

Mas não era culpa dela.

Ela não gosta de salto agulha.
Ela tem vergonha de sorrir.
Ela não solta o cabelo.
Ela se preocupava com o que os outros pensavam.

Mas não era culpa dela.

Mas não ignorar a multidão que não se importa,
abrir mão de ser mais feminina para não chamar atenção,
não sorrir e mostrar aos outros seu brilho,
assumir riscos e dizer o que sente...

Disso ela tinha culpa.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Eu + Tu = Nós

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Quando eu e tu nos somamos e viramos nós?

Quando eu mandei mensagem pra tu não esquecer meu cheiro?
Quando tu dissestes que gostava da minha mania de velar teu sono?
Ou quando nós começamos a rir no meio da cozinha sem motivo?

Quando eu beijei teus olhos antes de partir?
Quando tu mordestes minha orelha?
Ou quando nós dormimos de conchinha?

Quando eu cozinhei teu prato favorito?
Quando tu chorastes na minha frente por saudade?
Ou quando nós dormimos vendo estrelas?

Quando eu liguei para te lembrar do casaco que tu esquecestes?
Quando tu destes bronca em mim por esquecer lingerie dentro do chuveiro?
Ou quando nós dançamos sem música?

Quando a matemática fez sentido?
Quando nos cansamos de conjugar verbos na 1ª pessoa do singular,
e a 1ª pessoa do plural ficou tão agradável?